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16 de janeiro de 2012

Inovação com as ideias dos outros

por innovacentro

Como universidades, clientes e fornecedores podem ajudar pequenas e médias empresas a desenvolver produtos e serviços

O paulista Marcelo Golino, de 49 anos, costuma buscar nas universidades ideias de novos produtos para sua empresa, a Chemyunion, fabricante de componentes para xampus, hidratantes e cosméticos de Sorocaba, no interior de São Paulo. Com a ajuda de pesquisadores da Unicamp, de Campinas, e da Unesp, de Botucatu, a empresa desenvolve substâncias utilizadas por grandes clientes, como as brasileiras Natura e O Boticário e as multinacionais Johnson&Johnson e Unilever.

Desde que foi fundada, há 19 anos, a Chemyunion já depositou 23 pedidos de patentes de novas substâncias — boa parte delas desenvolvida por estudos de pesquisadores universitários. Essas descobertas ajudaram a empresa a obter receitas de 45 milhões de reais em 2011. “Não seríamos capazes de inovar tanto sem a colaboração de gente de fora da empresa”, diz Golino.

Casos de pequenas e médias empresas que buscam ajuda externa para criar produtos inovadores estão se tornando frequentes. Seus donos partem da constatação de que, numa pequena ou média empresa em que os recursos geralmente são limitados, fica mais difícil criar algo realmente novo sem o apoio de profissionais de fora do negócio.

“Há uma nova geração de empreendedores interessados em envolver universidades, clientes e fornecedores numa rede de colaboradores”, diz Anderson Rossi, professor do Núcleo de Gestão e Inovação da Fundação Dom Cabral, de Belo Horizonte.

A formação de uma rede de colaboradores externos para desenvolver produtos e serviços depende de saber onde encontrar bons parceiros. Também é necessário criar laços que mantenham seus integrantes engajados até o fim de um projeto.

Para manter a ponte com as universidades, Golino tem contratos com cinco professores – a Chemyunion paga, em média, 5.000 reais mensais para cada um. Em troca, eles ajudam a empresa a encontrar outros pesquisadores cujos estudos tenham potencial para gerar novos produtos.

Anualmente, a Chemyunion investe 7% do faturamento líquido em pesquisa e desenvolvimento — desse total, aproximadamente um sexto vai para pesquisadores externos, principalmente nas universidades. “Enxergamos um ganho mútuo nessa relação”, afirma Golino. “A empresa sugere uma linha de trabalho de seu interesse e o pesquisador tem nosso apoio para a pesquisa.”

Foi dessa química que surgiu um componente para cosméticos que hoje se tornou um dos principais produtos da Chemyunion. Em 2003, a empresa fechou uma parceria com uma equipe liderada pelo professor Luiz Cláudio Di Stasi, do Instituto de Biociências da Unesp, para pesquisar substâncias vegetais hidratantes – seu objetivo era encontrar moléculas que ativassem uma estrutura celular conhecida como aquaporinas, que são pequenos canais da pele que conduzem água para suas camadas mais profundas.

Em 2008, depois de um investimento de 700.000 reais, o trabalho resultou numa substância hoje vendida para fabricantes de cosméticos em países como Estados Unidos, China, Itália e Rússia.

Os laboratórios das universidades não são o único local onde se pode encontrar ajuda para inovar. “Clientes e fornecedores podem trazer contribuições valiosas para o desenvolvimento de produtos e serviços de uma pequena ou média empresa”, diz Rafael Levy, sócio da Allagi, consultoria especializada em programas de inovação para pequenas e médias empresas.

Os clientes de uma empresa podem ajudá-la a descobrir que tipo de produtos o mercado precisa — e testar os protótipos mais tarde. Os fornecedores podem adaptar ou desenvolver novas matérias-primas, ou ajudar a financiar pesquisas.

Dependendo do tipo de colaborador, a recompensa pelo apoio na inovação pode variar. É comum que, nesse tipo de parceria, os professores universitários trabalhem em troca de bolsas para levar seus estudos adiante.

Para os fornecedores, por exemplo, fechar contratos de longo prazo para as compras pode garantir o apoio necessário no desenvolvimento de uma nova matéria-prima. Aos clientes, é possível oferecer melhores condições de preços e prazos para quando o produto ou serviço que eles estiverem ajudando a desenvolver chegarem ao mercado.

O empreendedor Jöel Ponte, de 50 anos, mantém uma rede formada por 50 dermatologistas para auxiliá-lo no de­sen­vol­vi­men­to de novos produtos de sua empresa, o laboratório Purainova, de São Paulo. Ele os recompensa com viagens para congressos mé­dicos, seminários e cursos de atualização.

Esses profissionais têm um peso importante nas decisões que Ponte toma na empresa. No dia a dia do consultório, eles conseguem descobrir quais são as necessidades dos pacientes. Um dos principais produtos da Purainova surgiu de uma reunião com dez dermatologistas dessa rede.

“Um deles sugeriu que havia mercado para um produto que reduzisse o desconforto em pacientes que passam por procedimentos dermatológicos, como certos peellings”, afirma Ponte. Foi o ponto de partida para a empresa começar a desenvolver um produto com protetor solar, hidratante e creme de limpeza capaz de atender à demanda apontada pelos dermatologistas, que o ajudaram na fase de testes com os pacientes.

Nos próximos três anos, Ponte planeja lançar mais de 30 produtos. Hoje, a empresa tem 40 funcionários. Em 2012, ele espera aumentar o número de dermatologistas, chegando a uma rede com 800 profissionais. “Só com o pessoal contratado não daria para levar adiante nossos planos”, diz Ponte. “É por isso que a rede de colaboradores externos acaba sendo importante.”

Alguns fatores ajudam a impulsionar a busca das empresas por conhecimento fora dos muros da empresa. A universidade típica, que até recentemente se mantinha centrada no universo acadêmico, tornou-se mais aberta aos empreendedores. Algumas instituições criaram agências cujo trabalho é servir de ponte entre os cientistas e as empresas.

“O principal interesse da universidade é que a tecnologia chegue à sociedade e a parceria com a iniciativa privada permita transformar conhecimento em um produto ou serviço à população”, diz Fabíola Spiandorello, gerente de propriedade intelectual da agência de inovação da Unesp.

Recursos disponíveis para inovar existem. Agências de fomento, como a Finep, do governo federal, e Fapesp, mantida pelo estado de São Paulo, têm ampliado as linhas de financiamento para pequenas e médias empresas inovadoras. Em 2011, por exemplo, o Programa de Subvenção Econômica, da Finep, destinou 242 milhões reais para 105 projetos — desde 2005, o programa atendeu 600 pequenas e microempresas.

Às vezes, é possível conseguir no mercado o apoio financeiro para o desenvolvimento de um novo produto ou serviço. Foi o que fez a HRM&S, fornecedora de software e equipamentos para registro e controle de acesso a prédios, como catracas eletrônicas, que se abrem com um crachá.

Há dois anos, a empresa tinha planos para desenvolver um sistema de controle de expediente. “Queríamos fazer um software que fosse capaz de informar onde encontrar substitutos para cobrir a ausência de funcionários que se atrasam ou faltam ao trabalho”, diz Célio Antônio Silva, de 45 anos, um dos fundadores da HRM&S.

Para isso, ele calculava ser necessário um investimento de 500.000 reais, um volume de recursos que a empresa não tinha disponível. Silva acabou conseguindo o dinheiro com uma grande empresa prestadora de serviços de segurança patrimonial que tinha interesse no programa. “Com isso, pudemos montar uma rede de pesquisadores vinculados a duas universidades no Brasil e a uma no Chile”, diz Silva. “Isso nos permitiu desenvolver o software em apenas seis meses.”

Publicado na Revista Exame PME, em 16/01/2012 (por Carlos Petrocilo)

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